Uma noite para celebrar vitórias e conquistas. Assim terminou o dia de trabalho na obra do WTC Goiânia, na Praça do Ratinho, para oito trabalhadores das obras, que receberam o diploma de ensino médio. Para chegar lá, foram seis anos de aula, todos os dias, após o expediente pesado. Driblaram o cansaço porque entenderam que não era tarde para aprender.

A turma participou do projeto Ensino Consciente, promovido pela Consciente Construtora em parceria com o Sesi. Uma sala de aula itinerante foi montada pela empresa no canteiro de obras. Após o expediente, eles tomavam banho, lanchavam e abriam os livros. Os formandos ergueram três obras durante o período em que fizeram o ensino fundamental e ensino médio através da metodologia de Ensino de Jovens e Adultos (EJA).

Para comemorar um momento tão especial, a empresa realizou uma cerimônia de formatura para os alunos, com direito a beca, fotos e um jantar após a solenidade com suas famílias. Quem não escondia o orgulho de cada formando era a professora da turma, Paula Gabriela Ribeiro, cujo brilho no olhar dava mais ênfase para suas palavras.

“Os meus alunos me fizeram encontrar o meu lugar no mundo, todas as vezes que me deparei  com a vontade de aprender e vê-los descobrindo o conhecimento. Nesta jornada eu procurei mostrar a cada um que eles também tinham a contribuir porque eles me mostraram a cada dia que são as pessoas mais sábias que eu conheço. Sem papel, sem livro, absorveram tanta coisa ao longo da vida e agregaram tanto para nossas aulas”, disse.

Quase 400 alunos já passaram pelas salas de aulas itinerantes da Consciente Construtora. A iniciativa soma a de outras empresas do setor que abraçaram o desafio de diminuir o índice de analfabetismo e baixa escolaridade no setor da construção civil em parceria com o Sesi.  De acordo com o Sesi, em Goiás, nos últimos cinco anos, já são 1879 alunos formados dentro das escolas nas obras no Ensino Fundamental ou no Ensino Médio.

Os resultados do projeto já aparecem nas estatísticas. Um estudo realizado Federação das Indústrias do Estado de Goiás (FIEG) e Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Goiás (Sebrae-GO), em agosto e setembro do ano passado, sobre a mão-de-obra na construção civil em Goiás, identificou que em 10 anos – de 2011 a 2021 – o percentual de trabalhadores com Ensino Médio cresceu de 23% para 53%. Além de dados oficiais da RAIS, foram ouvidos 430 profissionais que trabalham em construtoras na região metropolitana.

“Queremos que nossos colaboradores se desenvolvam porque a construção civil tem muitas oportunidades. E nós testemunhamos muitas histórias de crescimento dentro do canteiro de obras, de colaboradores nossos que conquistaram novos postos na medida em que estudaram”, conta o diretor do Instituto Consciente, Felipe Inácio, responsável pelo projeto.

Histórias de superação

Cada formando trazia consigo uma história de superação. O armador Alexandro Francisco da Silva, de 41 anos, é um exemplo. Com o diploma de ensino médio em mãos, ele altera uma rota cujo destino ainda é o de milhões de brasileiros: a baixa escolaridade. Quando criança, morava na zona rural do nordeste e precisou ajudar a família em seu sustento. Chegou apenas à primeira fase do ensino fundamental. “Meus pais eram analfabetos, não havia muito incentivo para ir para a escola, que era longe de casa”, conta. Mudou-se para Goiânia com 18 anos em busca de oportunidades, já sendo nesta época casado e pai de um filho.

“Não dava nem tempo de pensar em estudo porque agora já tinha a minha própria família para cuidar”, continua. Chegou na Consciente Construtora em 2014 e encontrou, tempos depois, a chance de entender melhor os códigos das letras e números. Religioso, desejava ler a Bíblia por ele próprio, e não através da esposa. “Eu sou muito grato a Deus e à empresa por esta conquista. Hoje, não deixo de ler a Bíblia por nenhum dia. E também não tenho mais vergonha de preencher uma ficha”, conta.

Na sala de aula, Alexandro se encontrava todos os dias com o colega Admilson Soares Moreira, de 41 anos, também armador, que tinha parado de estudar aos 21 anos, sem concluir o ensino fundamental. “Não dava tempo de trabalhar e chegar na escola”, conta. A possibilidade de ter aulas no próprio canteiro o ajudou, mas, mesmo assim, ele confessa: foi difícil. “Tinha dia que eu quase cochilava na sala, mas eu persisti porque via tantos colegas como eu, depois de um dia puxado, lutando contra o cansaço para concluir os estudos.” Orgulhoso do filho, que estuda engenharia elétrica, ele também quer, no seu ritmo, seguir adiante.

“Porque hoje a gente não consegue nada sem estudo”, completa o seu colega formando, Wesley Monteiro da Silva, carpinteiro de 35 anos. Ele havia parado de estudar em 2010, quando saiu do Pará para Goiás. Voltou para a sala de aula pela facilidade das aulas acontecerem dentro do canteiro.  “Aqui a gente trabalha, toma banho, lancha e estuda”, diz. Os sonhos? “Vejo muitos colegas aqui dentro da empresa que eram muito simples e chegaram em algum lugar. Então eu posso também”, esperançou.

Uma de suas inspirações é o próprio presidente da Consciente Construtora, Ilézio Inácio  Ferreira, que fez questão de reforçar que os formandos podem alcançar ainda mais conquistas se continuarem na jornada em busca do conhecimento, compartilhando sua própria trajetória.

“Eu me formei em 1976 em Engenharia Civil mas, antes deste diploma, eu também fui servente de pedreiro como muitos de vocês. Se eu consegui crescer, vocês também podem. Vocês estão erguendo um empreendimento de padrão internacional, tem potencial, tem garra, arrojo. Não parem por aqui porque estamos em um País de oportunidades. Mas somos nós quem temos de ir buscá-las”, estimulou.

“Nossas palavras hoje são para expressar o nosso orgulho e reforçar o nosso incentivo a vocês, formandos. Não parem, continuem na busca por conhecimento por meio dos nossos cursos técnicos ou superior. O conhecimento, ninguém tira de nós”, salientou a diretora do Sesi Canãa, Raqueline Dias.