Goiânia tem vivido um crescimento otimista no mercado de arte – momento consagrado pela participação do artista goiano Dalton Paula, que é representado pela Cerrado Galeria, na internacional Bienal de Veneza, um dos eventos mais importantes para todo o setor. Na capital marcada pelo agronegócio e seus desdobramentos culturais, o circuito de arte – em especial, a contemporânea – desponta não apenas como alternativa de investimento, mas também como programação cultural e inspiração para outras áreas correlatas, como a arquitetura.
Caracterizada pela atualidade e diversidade de temas e formas que vão além do que era considerado tradicionalmente como uma obra de arte, a arte contemporânea iniciou-se por volta de 1960, cheia de contradições e com marcos que variam em cada localidade. Para o curador e diretor artístico da Cerrado Galeria, Divino Sobral, o início da arte contemporânea em Goiânia se deu em meados de 1970, marcado pelo início da produção artística recheada de temas políticos e atuais de Siron Franco, artista renomado e premiado já em 1975 pela Bienal de São Paulo e, atualmente, representado pela Cerrado Galeria.
Além deste, outros trabalhos, como os de Paulo Fogaça, que tem uma produção audiovisual crítica, também foram pioneiros na inserção das questões da arte contemporânea em Goiás, segundo Sobral. O diretor artístico da Cerrado Galeria considera ainda que a inauguração do Museu de Arte Contemporânea de Goiás em Goiânia, em 1988, foi um importante marco no cenário artístico da região.
Assim, são muitos os temas que compõem o quadro de produção contemporânea goianiense. “As obras exploram pesquisa de linguagens, materiais e suportes não convencionais e um diálogo com a indústria popular da comunicação. Alguns artistas criam mitologias urbanas a partir de fontes periféricas, enquanto outros ainda se voltam para a temática do agronegócio de maneira crítica ou originária”, explica Divino Sobral.
A diretora da Cerrado Galeria em Goiânia, Júlia Mazzutti, confirma que, de fato, as referências culturais regionais se destacam no trabalho de artistas goianos, tornando-os únicos frente ao cenário nacional e internacional. “A vida rural, a religiosidade, o clima, flora e fauna do bioma do Cerrado, as vivências urbanas e os mitos e lendas locais permitem uma produção mais autêntica, que extrapola o eixo tradicional das artes entre Rio de Janeiro e São Paulo”, detalha.
Arquitetura como reflexo da arte – Historicamente, a arte influencia de forma direta a arquitetura e, em Goiânia, não é diferente. Para o artista e arquiteto goiano Talles Lopes, é justamente o teor crítico da produção de artistas locais que tem contribuído para a elaboração de uma leitura mais plural desse cenário histórico e geográfico da cidade. “Em uma cidade tão permeada por mitos fundacionais como Goiânia, vejo que o trabalho artístico tem nos ajudado a repensar criticamente o nosso contexto local”, afirma.
Lopes rememora que, ao caminhar pelas regiões mais centrais de Goiânia, é fácil perceber como artistas e arquitetos modernos tiveram papel fundamental na concepção da cidade. “A arte contemporânea, junto a muitas outras manifestações artísticas, tem dinamizado o cenário histórico na capital, tanto por meio de suas narrativas como pela própria ocupação da cidade por meio da arte. Um exemplo é a ocupação de um edifício moderno projetado por Gustav Ritter pelo Museu do Depois do Amanhã (MUDDA), um projeto de extensão vinculado à Universidade Federal de Goiás (UFG)”, conta.
Com uma produção permeada pela revisão de arquivos, atlas, projetos arquitetônicos e catálogos de exposições, a arte de Talles Lopes coloca, com frequência, a arquitetura como elemento fundamental para pensar questões históricas e políticas mais abrangentes. O artista que já apresentou seu trabalho em espaços como o Museu de Artes Plásticas de Anápolis (MAPA), o Instituto Tomie Ohtake de São Paulo e o Museu de Arte Contemporânea de Castilla y León (MUSAC), na Espanha, agora está concorrendo ao prêmio PIPA, uma das mais importantes premiações na cena artística nacional da atualidade.
A diretora da galeria em Goiânia reitera que a Cerrado leva em conta o amadurecimento, a profissionalização e a descentralização do mercado de arte no país, bem como a firme convicção de que, no Centro-Oeste, há grande interesse e demanda por conteúdo de qualidade no campo das artes visuais. Por isso, a Cerrado Galeria pretende seguir expandindo de maneira contundente a produção artística regional no mercado de arte nacional e internacional, segundo ela.
“O programa da galeria – artistas representados, exposições e eventos – construído sob a direção artística de Divino Sobral, visa que a Cerrado esteja cada vez mais conectada com as questões atuais apresentadas pelo circuito de arte contemporânea. Atualmente, esses temas abordam principalmente demandas decoloniais, raciais e de sexualidade, vistas sob a perspectiva dos jovens artistas goianos”, finaliza Júlia Mazzutti.
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